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Palavra do Bispo | Homilia

Homilia

HOMILIA ESPIRITUALIDADE DO CLERO

FESTA DE SÃO LEÃO MAGNO

10 DE NOVEMBRO DE 2020

 

“Possa a Igreja, fundada sobre a rocha inabalável dos Apóstolos, permanecer firme na verdade e gozar paz para sempre” (cf. Oração).

 

Essa oração do dia, seguida da proclamação da Palavra de Deus, na Liturgia da Palavra de hoje, nessa celebração eucarística, ilumina a compreensão dos motivos pelos quais se reúne hoje (10.11.20) o clero da Diocese de Mogi das Cruzes. Destaco três entre os motivos:

 

  1. A Festa de São Leão Magno – Papa e doutor da Igreja;
  2. O Aniversário natalício do Pe. Giovanni Cosimati, acrescentado do aniversário natalício do diácono permanente João Bosco de Toledo e aniversário de ordenação sacerdotal do Pe. Luiz Cláudio Rocha Rodrigues;
  3. O momento de espiritualidade do clero diocesano, com o objetivo de mitigar, na medida do possível, a falta do retiro espiritual anual do nosso clero.

 

Destaco das leituras três versículos para ilustrar cada um desses três motivos: dois da carta de São Paulo a Tito e um do Evangelho de Lucas, que acabamos de proclamar. São eles:

 

  1. Caríssimo, o teu ensino seja conforme a sã doutrina ugiainoush didaskalia.– (Tt 2,1).

Este versículo é uma exortação de Paulo na 1ª. leitura e ilustra a celebração da Festa de São Leão Magno. Papa e doutor da Igreja, São Leão Magno imortalizou-se como guardião e propagador da sã doutrina, sendo mestre e mistagogo da Igreja dos primeiros séculos (sec. V). Apontou para o Mistério de Cristo Homem-Deus, isto é, a doutrina do Verbo Encarnado, tema do Concílio de Calcedônia, no ano de 451. De fato, esse Concílio “refletiu sobre as duas naturezas na única pessoa de Cristo e, ao final, afirmou que Jesus é ‘perfeito tanto na divindade quanto na humanidade; Ele mesmo é, na verdade, Deus e realmente homem’ ...” Outro esforço, nessa época, “foi a busca pela unidade da Igreja, dando sentido à frase atribuída a Santo Agostinho: ‘No essencial, a unidade; na dúvida, liberdade; em tudo, caridade’ ...” (Suzana Costa Coutinho, Revista Ecoando, 2020). 

 

  1. Os mais velhos sejam sóbrios, ponderados, prudentes, fortes na fé, na caridade, na paciência ... (Tt 2,2).

Este, outra exortação de Paulo, na 1ª. leitura, se aplica à pessoa do Pe. Giovanni, por ocasião da celebração do seu aniversário natalício. Sim, são qualidades do Pe. Giovani: sóbrio, ponderado, prudente, forte na fé, na caridade, na paciência. Rendemos graças a Deus pelo precioso dom de tê-lo entre nós há tanto tempo (mais de quarenta anos), desde que veio da Itália para o Brasil e se estabeleceu em Itaquaquecetuba. Passo a passo, ele foi se tornando esse grande exemplo de missionário valente e desprendido, sacerdote zeloso e dedicado, cristão perseverante e exemplar, amigo jovial e sincero. Em sua pessoa, nota-se a busca constante da santidade pessoal, a dedicação diária e incansável ao povo de Deus e a alegre entrega total no sacerdócio. Servindo-se também do seu talento musical, Pe. Giovanni tem sido para os sacerdotes mais jovens, modelo em quem podem se espelhar, fonte de dinamismo e esperança.

 

  1. Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer (Lc 17,10).  

Esse versículo é retirado do evangelho de hoje e se aplica a cada um de nós, pois se refere à espiritualidade de serviço, que é a espiritualidade do clero. O realismo de tal afirmação vem em auxílio dos cristãos, dos sacerdotes, dos missionários a não se apoiarem nos próprios méritos, visto que a salvação é dom gratuito de Deus. É um pensamento que traz serenidade ao coração e a liberdade de espírito, pois “O Senhor é o Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade” (2Cor 3,17-18). De fato, a verdadeira alegria se encontra no serviço que se realiza e não na recompensa que se porventura se recebe. E mais, para os ministros sagrados, a espiritualidade do serviço se completa na espiritualidade de comunhão (NMI 43-45).

 

E desse caminho espiritual do presbítero, convém recordar três aspectos:

 

1) O primeiro é a oração pessoal. A carta apostólica do Papa João Paulo II Novo Millennio Ineunte (no início do novo milênio), de 6 de janeiro de 2001, nos números 32 a 34, fala da necessidade de sempre se aprender a rezar e de continuar pedindo: “Senhor, ensina-nos a rezar” (Lc 11,1) (NMI 32). A oração profunda fortalece e leva à contemplação da presença e da grandeza de Deus.

 

2) O segundo é o serviço litúrgico ao povo de Deus. É preciso educar para a oração (NMI 34). Ao presidir a liturgia da Igreja, os ministros sagrados ajudam as comunidades cristãs a se tornarem autênticas “escolas’ de oração” (NMI 33) ... uma oração intensa que não afasta do compromisso na História e que tem na eucaristia o cume e a fonte (SC 14; PDV 48) da vida eclesial. E, assim, o povo de Deus é alimentado, especialmente no dia do Senhor, pela eucaristia dominical: “celebrando precisamente a sua Páscoa não só uma vez por ano mas todos os domingos, a Igreja continuará a indicar a cada geração ‘o eixo fundamental da História, ao qual fazem referência o mistério das origens e o do destino final do mundo’ (NMI 35)”.

 

3) O terceiro é a caridade pastoral e a espiritualidade de comunhão. “A caridade de Cristo nos compele” (2Cor 5,14). No que concerne à espiritualidade  ligada ao exercício da caridade pastoral, a vida presbiteral e comunitária do padre diocesano acontece em união com o bispo e com os irmãos no presbitério. A espiritualidade de comunhão (NMI 43-45) implica em fazer da Igreja casa e escola de comunhão, ter o olhar do coração voltado para o mistério da Trindade e a capacidade de sentir o irmão na fé na unidade profunda do Corpo Místico.

 

“Espiritualidade da comunhão é ainda a capacidade de ver, antes de mais nada, o que há de positivo no outro, para acolhê-lo e valorizá-lo como dom de Deus. É saber «criar espaço» para o irmão, levando «os fardos uns dos outros» (Gal 6,2) e rejeitando as tentações egoístas que sempre nos insidiam e geram competição, arrivismo, suspeitas, ciúmes. Não haja ilusões! Sem esta caminhada espiritual, de pouco servirão os instrumentos exteriores da comunhão. Revelar-se-iam mais como estruturas sem alma, máscaras de comunhão, do que como vias para a sua expressão e crescimento” (NMI 43). A comunhão efetiva passa pela comunhão afetiva.

 

Enfim, depois de tudo, resta experimentar a serena alegria de poder afirmar: “somos servos inúteis; fizemos o que deveríamos fazer”. A recompensa consiste na graça de perseverar e prosseguir, com a graça de Deus, percorrendo os caminhos da radicalidade no seguimento (Mc 8,27 – 10,52): “se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz cada dia, e siga-me” (Lc 9,26). 

 

Louvado seja Deus pela solidez da doutrina da Igreja, da qual São Leão Magno se tornou intrépido defensor. Louvado seja Deus pelo dom da vida do Pe. Giovanni, presente de Deus para esta diocese. Louvado seja Deus que generosamente faz de nós um clero numeroso, unido e serviçal. Louvado seja Deus por essas e por tantas outras maravilhas que o Senhor prodigamente realiza junto ao seu povo. Nossa Senhora, Mãe da Igreja e Mãe das vocações, rogai por nós! Amém!

 

Dom Pedro Luiz Stringhini

Mogi das Cruzes, 10 de novembro de 2020