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Palavra do Bispo | 53ª Assembleia Geral da CNBB - 2015

53ª Assembleia Geral da CNBB - 2015

1. Introdução. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil foi fundada em 1952 (62 anos). Realiza a cada ano a assembleia geral. Este ano é a de número 53. Por décadas, acontecia em Itaici, Indaiatuba-SP. Há cinco anos, passou a ser realizada em Aparecida-SP. Os cerca de trezentos e cinquenta bispos participantes se hospedam no Hotel Rainha do Brasil, celebram a missa diária no santuário nacional de Nossa Senhora Aparecida e realizam as reuniões no centro de convenções.

As assembleias são para os bispos rico momento de encontro fraterno, trabalho e oração. O fim de semana é dedicado ao retiro espiritual, nesse ano orientado por Dom Geraldo Lyrio Rocha, que apresentou meditações a partir do tema: “o múnus episcopal à luz do Vaticano II”. Meditou sobre os três múnus: santificar, ensinar, governar.

A assembleia acontece no momento da promulgação da Bula Misericordiae Vultus, do papa Francisco, instituindo o Ano Santo da Misericórdia, a ser iniciado no dia 8 de dezembro de 2015 com encerramento na festa de Cristo Rei de 2016.

Dom Giovanni d'Aniello, Núncio Apostólico no Brasil, agradeceu o convite dos bispos  e a hospitalidade. “Obrigado a todos aqueles que, durante esses dias, tomarão conta de nós”. Transmitiu um abraço especial do papa Francisco, ressaltou a memória dos 50 anos da conclusão do Concílio Vaticano II e a realização do Sínodo Ordinário, deste ano, sobre a Família.

 

2. Conjuntura nacional. A análise da foi apresentada pelo ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero. “Quero apenas oferecer uma ajuda, ´pensando alto´ a respeito da realidade a partir da sensibilidade de um cristão”. “Precisamos do mínimo denominador comum que poderia unir a todos os brasileiros de boa vontade, acima das visões divergentes, para que o Brasil não sofra nenhum retrocesso nas conquistas nos últimos 30 anos. Conquistas no plano político, institucional e, principalmente, no combate à pobreza”, disse. “Qualquer sociedade será julgada pela maneira como trata os mais pobres, os mais frágeis, os mais vulneráveis. Esse é o sentido principal da ação política”, acrescentou.

Falou da necessidade de se retomar o crescimento, pois “sem crescimento não há base para melhorar a vida social”. E lembrou que, se o crescimento não for retomado em pouco tempo, as conquistas sociais estarão ameaçadas. Ricupero citou, da Bula Misericordiae Vultus, a frase de Paulo VI, pronunciada no encerramento do Concílio Vaticano II, em 7 de dezembro de 1965: “em vez de diagnósticos desalentadores, se dessem remédios cheios de esperança; para que o Concílio possa falar ao mundo atual não com presságios funestos mas com mensagens de esperança e palavras de confiança”.

Resumiu apresentando três desafios: o econômico (geração de emprego), o social (conquistar a igualdade), o ecológico (preservar o meio ambiente). Concluiu com outra citação do papa Francisco em discurso feito no Brasil, em 2013: “Quando me pedem um conselho, minha resposta é sempre a mesma: diálogo, diálogo, diálogo. Ou se aposta no diálogo e na cultura do encontro ou todos perdemos”.

 

3. Nota sobre o momento nacional. Aqui, os bispos falam da necessidade de se retomar o crescimento econômico sem trazer prejuízo à população, aos trabalhadores e, principalmente, aos mais pobres. Refere-se à lei que permite a terceirização do trabalho, em tramitação no Congresso Nacional, com tendência a restringir os direitos dos trabalhadores. É urgente combater a corrupção, presente tanto em órgãos públicos quanto em instituições da sociedade civil. É imperativo recuperar uma cultura que prima pelos valores da honestidade e da retidão. Recordam que os povos indígenas até hoje não receberam reparação das injustiças que sofreram desde a colonização do Brasil (demarcação e homologação das terras, e o fim dos conflitos).

Insiste a nota que a redução da maioridade penal não é solução para a violência que grassa no Brasil. É preocupante a política de encarceramento num país que já tem a quarta população carcerária do mundo. Investir em educação de qualidade e em políticas públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para preservar os adolescentes da delinquência e da violência. O Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor há 25 anos, responsabiliza o adolescente, a partir dos 12 anos, por qualquer ato contra a lei, aplicando-lhe as medidas socioeducativas.

O Projeto de Lei 3722/2012, que altera o Estatuto do Desarmamento, é outra matéria que vai na contramão da segurança e do combate à violência. A arma dá a falsa sensação de segurança e de proteção.

Faz-se necessário uma Reforma Política que atinja as entranhas do sistema político brasileiro. Apartidária, a proposta da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, da qual a CNBB é signatária, se coloca nessa direção.

 

4. A realidade eclesial. A análise, apresentada pelo Pe. Joel Portela, tem como pressuposto “a realidade que interpela a Igreja e a Igreja que interage com a realidade”. E a realidade, hoje, é de perplexidade, “num tempo de questionamento até mesmo das cláusulas pétreas existenciais”. Ou seja, predomina a “lógica da flexibilidade e mobilidade nos critérios, inclusive nos campos ético e religioso”. Predomina também a “lógica da individualidade; da solução para cada um, com grande dificuldade para olhar o todo, para se sentir parte do conjunto”. E prevalece também “lógica do imediato, da solução a curto prazo ...”. 

Contudo, num tempo de poucas referências, pode-se ver na pessoa e no ministério do Papa Francisco um dos “sinais interpeladores do Espírito para nossos dias”, qualificando-o como uma voz em destaque, uma voz que acolhe, uma voz que escuta, vai ao encontro e insiste na misericórdia. Assim, a Igreja é interpelada a uma ação pastoral que incida positiva e eficientemente na vida das pessoas, por meio de uma pastoral, como orienta o Papa Francisco, do diálogo, acolhimento, saída, missionariedade ...

 

5. Diretrizes. A 53ª assembleia elaborou o texto das diretrizes gerais da ação evangelizadora da Igreja no Brasil para o quadriênio 2015-2019. Tais diretrizes foram aprovadas mantendo as cinco urgências: missão, comunidades eclesiais, iniciação cristã, animação bíblica, serviço da caridade aos pobres. São as mesmas diretrizes do quadriênio anterior, porém enriquecidas com citações do magistério do Papa Francisco, especialmente na exortação Evangelii Gaudium.

 

6. Leigos. Tratou-se também do documento “Cristãos leigos e leigas, sujeitos na Igreja e na Sociedade”. Os cristãos leigos são sujeitos enquanto participantes na missão da Igreja, pois o Espírito Santo se manifesta neles. Participam nas pastorais, conselhos, coordenações, ministérios. É importante que tenham liberdade para descobrirem-se no caminho do discipulado.

 

7. Eleições. A assembleia elegeu a nova presidência da CNBB: Dom Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília, presidente; Dom Murilo Sebastião Krieger, arcebispo primaz do Brasil, vice-presidente; Dom Leonardo Ulrich Steiner, reeleito secretário. Foram eleitos também os presidentes das 12 comissões episcopais de pastoral, na seguinte composição: Ministérios ordenados e a Vida consagrada: Dom Jayme Splenger; Ação missionária e Cooperação intereclesial: Dom Esmeraldo Barreto de Farias; Laicato: Dom Severildo Clasen; Liturgia: Dom Armando Bucciol; Ecumenismo e Diálogo inter-reliogioso: Dom Francesco Biasin; Animação bíblico-catequética: Dom José Antonio Peruzzo; Vida e a Família: Dom João Bosco Barbosa de Sousa; Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz: Dom Guilherme Antonio Werlang; Cultura e Educação: Dom João Justino de Medeiros Silva; Doutrina da Fé: Dom Pedro Carlos Cipollini; Comunicação Social: Dom Darci José Nicioli; Juventude: Dom Vilsom Basso.

 

8. Liturgia. Dom Armando apresentou texto intitulado “Liturgia e Vida da Igreja”. A questão não é como se vive a liturgia, mas como se vive da liturgia. “Viver da liturgia que se celebra significa viver daquilo que a liturgia faz viver: o perdão invocado, a Palavra de Deus escutada, a ação de graças elevada, a Eucaristia recebida como comunhão. A liturgia é fonte de vida espiritual e motor da evangelização: “a evangelização jubilosa torna-se beleza na liturgia. A Igreja evangeliza e se evangeliza com a beleza da liturgia, que é também celebração da atividade evangelizadora e fonte de um renovado impulso para se dar” (EG 24).

 

9. Juventude. A assembleia foi marcada e enriquecida pela presença da Juventude que passou toda a noite de sábado em vigília de oração na basílica, encerrando no domingo, na missa das 11 horas, com os bispos. Os jovens estiveram presentes para o lançamento do projeto Rota 300 ou Aparecida 300 anos, com o lema 300 anos de bênçãos: com a Mãe Aparecida, Juventude em Missão. O santuário nacional e toda a Igreja no Brasil prepara a celebração dos trezentos anos do encontro da imagem de Nossa Senhora nas águas do Rio Paraíba, que acontecerá em 2017. A juventude quer participar de forma missionária desse processo, como foi a preparação para a jornada mundial da Juventude. De agora até 2017, os jovens conduzirão a imagem peregrina de Nossa Senhora Aparecida em todas as Dioceses do Brasil.

 

10. Reforma Política. Dom Joaquim Giovani Mohl Guimarães fez uma clara, lúcida e brilhante exposição sobre o árduo processo de articulação, elaboração e mobilização em vista de um projeto consistente e sério de Reforma Política. Para isso, formou-se uma Coalizão por Reforma política e Eleições limpas, coalizão essa formada não por partidos políticos, mas por uma centena de entidades da sociedade civil, entre as quais se inclui a CNBB. Esse projeto tem custado críticas e agressões infundadas à CNBB, sobretudo através dos meios eletrônicos. Como foi por ocasião da mobilização em prol da Lei da Ficha limpa, também nesse caso, as dioceses são interpeladas a procederem a uma coleta de assinaturas (são necessárias um milhão e meio), que resultem num projeto de iniciativa popular.

 

11. Solidariedade. A Cáritas Nacional apresentou um balanço dos quinze anos do Fundo Nacional de solidariedade, resultante da coleta da solidariedade, cada ano, por ocasião da Campanha da Fraternidade. Nessa mesma linha, foi apresentado o resultado de uma pesquisa sobre a ação social da Igreja. Os números mostram o quanto essa ação incide de forma positiva e eficaz na sociedade brasileira. São 29 milhões de pessoas beneficiadas, ou seja, 67% da população pobre do país são beneficiados, sobretudo pelas obras sociais e, em menor porcentagem, pelas pastorais sociais.

 

12. Amazônia. Dom Cláudio Hummes, presidente da Comissão episcopal para a Amazônia, fez relato a partir do que tem pessoalmente constatado em suas viagens pelas dioceses e prelazias da Amazônia. Ele está, com toda a comissão, empenhado em motivar uma cooperação missionária entre as dioceses, sensibilizando-as em relação às dificuldades pelas quais passa a Igreja da Amazônia, como as grandes distâncias e a escassez de sacerdotes. Falou do sofrimento dos povos indígenas. “Os índios são os mais pobres dos pobres; deles se tirou tudo, desde a terra até a identidade” e há que se considerar que “eles são sujeitos de sua história incluindo a história religiosa”, afirmou. Dom Claudio falou da recém-criada REPAM – Rede Eclesial Panamazônica.

 

13. Povos indígenas. Também o persistente e combativo Dom Erwin Kreutler, bispo da Prelazia do Xingu, encerrando seu mandato como presidente do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), fez mais um apelo em favor dos povos indígenas, evocando a Constituição Federal, no artigo 231: “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. Ele afirma que “a terra, para estes povos, não se reduz a mera mercadoria ou a um bem a ser explorado até à exaustão; é seu espaço vital, o chão de seus ritos e mitos, o território de suas lutas históricas pela sobrevivência”. E faz uma citação: “O Brasil não tem ideia da riqueza humana e cultural que se perde ao se insistir em uma política que não se cansa de tentar transformar índios em pobres, ‘integrados’ às levas de marginalizados que ocupam as periferias das grandes cidades” (Maria Rita Kehl e Daniel Pierri, Folha de SP, 19.04.15). Dom Erwim agradeceu a todos, lembrando que “a Igreja nunca abandonou os povos indígenas nem os deixou sozinhos”.

 

14. Concílio. O momento ecumênico foi marcado por uma sessão comemorativa dos 50 anos de encerramento do Concílio Vaticano II. Essa sessão contou com a presença de uns dez representantes (pastores e pastoras) de outras Igrejas cristãs, membros do CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs). Foi um forte momento de ação de graças, com o canto do Te Deum, os depoimentos e a apresentação de imagens do próprio Concílio. Pode-se ouvir a voz do Papa João XXIII, quando despediu a multidão reunida na Praça de São Pedro, na sessão inicial, naquele dia 8 de dezembro de 1962. Era uma noite enluarada e ele despedia a multidão com palavras poéticas e singelas, convidando as pessoas a olharem a lua e perceberem nela um brilho especial; a voltarem para as casas e lançarem um olhar diferente e com um carinho especial para as crianças, pois possivelmente as crianças estariam esperando por isso. E concluía lembrando que o concílio que se iniciava trazia uma esperança nova para a Igreja e para o mundo.

João XXIII morreria no ano seguinte (1963) e Paulo VI levaria o Concílio a bom termo (08.12.1965). E essa é uma história que a Igreja não conta só como fato passado mas que continua a ser escrita no dia a dia da vida de cada cristão e de cada  comunidade eclesial. Dessa 53ª assembleia da CNBB, participaram dois remanescentes padres conciliares: Dom Mauro, emérito de Iguatu, e Dom José Maria Pires, emérito de João Pessoa.

 

Dom Pedro Luiz Stringhini

Aparecida-SP, 23 de abril de 2015