A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil realizou, em Aparecida-SP, em abril de 2016, sua 54ª assembleia geral ordinária, tendo à frente Dom Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília e presidente, Dom Murilo Krieger, arcebispo primaz de Salvador-BA e vice-presidente e Dom Leonardo Ulrich Steiner, auxiliar de Brasília e secretário geral. A assembleia contou com a participação de cerca de trezentos bispos, muitos dos quais são eméritos. Dos muitos assuntos e comunicados tratados, seguem alguns de grande relevância.
1. O catolicismo no Brasil e o fenômeno da mudança de religião.
Segundo a Dra. Sílvia Fernandes, há um cenário de mudanças no contexto sócio-religioso brasileiro e uma diminuição do percentual de católicos no Brasil. Os católicos somam 64% da população brasileira e o que se constata é que há um pluralismo cristão, com católicos em mobilidade, evangélicos não determinados e evangélicos não vinculados.
Os ‘sem religião’ somam 8,9% em 2010. E desses, só 0,5% declaram que não acreditam em Deus, ou seja, muitas vezes quando dizem que não têm religião estão dizendo que não frequentam nenhuma igreja. A mudança de religião ocorre mais entre a idade de 20 a 50 anos. Resumindo os dados: em 1980, os católicos somam 89%; em 1991, 83,3%; em 2000, 73,9% e, em 2010, 64,5%.
2. Cristãos leigos e leigas na Igreja e na Sociedade – “Sal da Terra e Luz do Mundo” (Mt 5,13-14)
Os bispos se dirigem aos cristãos leigos e leigas “agradecidos pelo testemunho de sua fé, pelo amor e dedicação à Igreja e pelo entusiasmo com que se doam ao povo e às comunidades, até ao sacrifício de si, de suas famílias e de suas atividades profissionais” (n. 1). O documento vem marcado pela ideia de que “cada cristão leigo é chamado a ser um sujeito eclesial para atuar na igreja e no mundo” (n. 1), considerando que, por vocação, os leigos são “corresponsáveis pela nova evangelização” (n. 2).
A reflexão é inspirada pelas “conclusões do Concílio Ecumênico Vaticano II, a atualidade da Conferência de Aparecida e a eclesiologia missionária e renovadora do Papa Francisco” (n. 2). Também “a realidade eclesial, pastoral e social dos tempos atuais torna-se um forte apelo” a se aprofundar o tema do laicato (n. 3).
A Lumen Gentium (LG 31) afirma que “a vocação própria dos leigos é administrar e ordenar as coisas temporais, em busca do Reino de Deus. Os leigos são chamados por Deus a serem fermento de santificação no seio do mundo” (n. 5). São interpelados a agirem no “vasto e complicado mundo da política, da realidade social, da economia, da cultura, das ciências e das artes” (n. 6, citando EN n.70).
A participação dos leigos na ação pastoral da Igreja nasce do Batismo e da Crisma (cf. EG n. 102) e tem a ver com sua identidade, vocação, espiritualidade, missão. O método proporciona ver “os rostos do laicato”, julgar “em perspectiva eclesiológica, considerando a diversidade de carismas e ministérios na Igreja” e agir em vista da “ação transformadora dos cristãos leigos na Igreja e no mundo” (n. 12).
3. Declaração sobre o momento político nacional.
O documento aponta algumas necessidades: combater a corrupção, que é intrínseca, histórica e solidificada no país; preservar as instituições (executivo, legislativo, judiciário, ministério público) e o estado democrático de direito, conquistado com lutas e sofrimentos; aprofundar as conquistas e avanços sociais que proporcionaram superação da miséria e da fome, garantir a inclusão de milhões de brasileiros que saíram da extrema pobreza; realizar uma profunda, ampla e estrutural reforma política, a começar pelo sistema eleitoral; fazer a reforma tributária, visto que o peso dos impostos penaliza os pobres enquanto os ricos mantêm seus privilégios. E dos meios de comunicação, espera-se imparcialidade e compromisso com a verdade.
4. Mensagem para as eleições 2016.
Convoca os católicos à participação cidadã que permita sonhar “com um país próspero, democrático, sem corrupção, socialmente igualitário, economicamente justo, ecologicamente sustentável, sem violência nem discriminação, sem mentiras e com oportunidades iguais para todos”.
As eleições municipais, em que se elegem prefeitos e vereadores, despertam nos eleitores interesse em participar, visto serem os candidatos mais conhecidos. “A Lei da Ficha Limpa há de ser, neste caso, o instrumento iluminador do eleitor para barrar candidatos de ficha suja”.
Dos candidatos católicos requer-se compromisso com a defesa “da vida, com a ética, com a transparência, com o fim da corrupção”. É salutar também “a renovação de candidaturas pondo fim ao carreirismo político”. Enfim, sejam “as eleições municipais ocasião de fortalecimento da democracia”.
5. Amoris Laetitia – A alegria do amor.
A exortação apostólica pós-sinodal do Papa Francisco Amoris Laetitia, com o subtítulo Sobre o Amor na Família, é dirigida aos bispos, aos presbíteros e aos diáconos, às pessoas consagradas, aos esposos cristãos e a todos os fieis leigos. Em nove capítulos, aborda temas como: a Palavra de Deus que ilumina a realidade e os desafios das famílias, a vocação família (a partir de Jesus), o amor no matrimônio (a partir de 1Cor 13), o amor que se torna fecundo (nos membros da família), algumas perspectivas pastorais, a educação dos filhos, as situações de fragilidade (mais que situações irregulares ou de pecado), espiritualidade conjugal e familiar.
Com enfoque na misericórdia, considera a pessoa humana acima dos critérios jurídicos, isto é, mais que a moral dos princípios e normas gerais, privilegia a moral da situação. O Papa dá ênfase à dimensão positiva da alegria e da beleza da família, que não deve ser vista como problema mas como oportunidade.
O trabalho da Igreja tem que ser preventivo, promovendo a educação para o amor, o sentido da vida e da sexualidade, a formação das consciências, levando em consideração os aspectos psicológicos e os sentimentos. Os pastores dediquem-se a amparar os jovens, preparar os noivos, acompanhar os casados. Dêem atenção a quem passa por problemas. Qual hospital de campanha, a Igreja cuide dos feridos para que sarem e dos sadios para que não se firam.
Ao abordar as situações de fragilidade, há que se levar em conta o princípio da gradualidade, isto é, não tomar como ponto de partida o ideal (as exigências objetivas da lei), mas a situação real, pois as pessoas podem percorrer um caminho de superação das dificuldades e dar passos até atingir a situação ideal.
6. O que se espera da Igreja.
Segundo o Cardeal Gianfranco Ravasi, para os tempos de hoje, espera-se: 1. Uma Igreja submetida e nutrida pela Palavra de Deus; 2. Uma Igreja que tenha como centro a Eucaristia; 3. Uma Igreja da misericórdia, da caridade, da justiça; 4. Uma Igreja que fala mais pelo testemunho operoso que pelos documentos; 5. Uma Igreja consciente da necessidade da distinção entre Fé e Política (dai a César o que é de César ...) e que ao mesmo tempo marque presença na sociedade; 6. Uma Igreja que não teme a cultura e as culturas (diálogo entre fé e ciência); 7. Uma Igreja do Espírito Santo e do discernimento, atenta aos sinais dos tempos, menos engessada, mais livre e mais festiva.
Dom Pedro Luiz Stringhini
Mogi das Cruzes, 25 de abril de 2016
Festa do evangelista São Marcos